Rio de Janeiro, 17/05/2014

Presidente da Câmara manda arquivar representação contra o deputado Leonardo Quintão, relator do novo Código da Mineração, que é financiado por mineradoras


Do Instituto Socioambiental

O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), mandou arquivar, anteontem (quarta-feira), a representação encaminhada à Mesa da casa contra seu colega de partido e relator do novo marco legal da mineração (Projeto de Lei 37/2011), Leonardo Quintão (PMDB-MG), pelo fato dele ser financiado por empresas do setor.
De acordo com Alves, o PL trata de “regras gerais, aplicáveis indistintamente a todas as empresas que atuam no setor”, motivo pelo qual não estaria relacionado aos interesses de nenhuma empresa em especial (veja despacho de Henrique Alves).
O inciso VIII do Art. 5º do Código de Ética da Câmara afirma que fere o decoro parlamentar “relatar matéria submetida à apreciação da Câmara dos Deputados, de interesse específico de pessoa física ou jurídica que tenha contribuído para o financiamento de sua campanha eleitoral”. Por causa disso, um conjunto de organizações da sociedade civil, inclusive o ISA, encaminhou, na semana passada, uma representação pedindo a destituição de Quintão da relatoria do PL 37/2011 (saiba mais).
Em vídeo gravado em dezembro, o deputado admite que é financiado por mineradoras e que defende, sim, o setor (veja aqui). Em entrevista dada agora à Agência Câmara, no entanto, ele negou que advogue pelos interesses de mineradoras. Para justificar seu novo posicionamento, lembrou que o projeto foi enviado à Câmara pelo governo e que seu parecer seria contrário a essas empresas, uma vez que aumenta os royalties pagos por elas, de 2% para 4% sobre o faturamento. “Uma tese política, tentando ferir a minha honra como pessoa, tentando ferir um projeto que é de interesse nacional, de cunho nacional, para impedir que os recursos cheguem a Minas Gerais e ao Pará, que são governados pelo PSDB. Uma perseguição claramente política”
– Pela interpretação de Henrique Alves, só haveria conflito se o deputado estivesse relatando projetos de lei que fizessem menção específica a essas empresas. Isso, na prática, significa inutilizar a regra conquistada no Código de Ética, pois, por definição, os projetos de lei devem tratar de assuntos gerais, e não de assuntos de interesse específico dessa ou daquela pessoa. Como nunca haverá um projeto de lei que fale especificamente de determinada empresa, nunca haverá quebra do decoro – lembra Raul do Valle, coordenador de Política e Direito Socioambiental do ISA e um dos autores da representação. – É uma interpretação totalmente absurda, que mostra bem porque o parlamento brasileiro é tão mal visto pela sociedade. Isso tem que mudar – finaliza Valle.
– A ideia de que um deputado não possa relatar matéria de interesse de financiador é elementar. É evidente que há conflito de interesses. O parlamentar não é eleito para defender os interesses do financiador, mas de todo eleitorado, da cidadania. A norma do Código de Ética é clara – contesta o juiz Márlon Reis, coordenador para Assuntos da Reforma Política da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e um dos fundadores do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE).
Reis alerta que no momento em que regula o setor da mineração, o PL 37/2011 está diretamente relacionado aos interesses das empresas do setor. Ele avalia ainda que mesmo que o Código de Ética não previsse a regra, a Constituição é clara ao impor o princípio da impessoalidade no trato da coisa pública, o que, por si só, seria suficiente para colocar em dúvida a conduta de Quintão.
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