Artigos

Universidades e a permanente busca de sentido

Cândido Grzybowski
Sociólogo, presidente do Ibase

Como quem vê fantasmas em toda parte e com a intenção de desconstruir conquistas de direitos, instituições e políticas democráticas, somos surpreendidos, dia a dia, com sandices e propostas de governo próximas ao ridículo. Material farto para cartunistas e comediantes, além de dar protagonismo aos destemperos e irresponsabilidades nas redes sociais dos círculos próximos ao poder. Será que a capacidade de resiliência da complexa sociedade brasileira diante de tal quadro, dadas as suas históricas e estruturais desigualdades, segregações e destruições, vai alimentar a intolerância e o ódio ou irá provocar resistências cidadãs?
Limito-me aqui a destacar a ameaça às universidades e sua autonomia, expressa pelo ministro da educação, Abraham Weintraub. As universidades são instituições de referência para a sociedade na produção de conhecimento sobre si mesma, sua história, seus desafios, sua identidade e cultura, bem como para o desenvolvimento científico e tecnológico de que necessitamos. Não são depósitos de um saber avaliado pela sua mera utilidade imediata, mas espaços privilegiados e fundamentais para produzir novo saber no embate entre o já pensado e sistematizado e os novos desafios para compreender a realidade que se vive e suas condições naturais, sociais, políticas, econômicas e culturais. A vitalidade de uma universidade está na busca em que o limite é o universo. Este é o seu sentido. Tentar limitá-las a serem reprodutoras de conhecimento científico e técnico, sem se questionar dos porquês e para quês, do sentido disto e daquilo para o viver humano num mundo de possibilidades e limites ainda a explorar, de tentar novas direções e abrir novos caminhos, novos modos de pensar e se organizar, enfim, de buscar e buscar, é matar o sentido de serem universidades.
Mas parece que o ministro e o governo de que faz parte não pensam assim, sobretudo aquele núcleo mais identificado com o discurso moralista e conservador do bolsonarismo e do mentor Olavo de Carvalho. O incrível é que estamos diante de uma inspiração e um modo de ver a sociedade, a seu modo, legítimos, mas que se apresentam como detentores únicos da verdade, negando todos os outros. Com a sua visão estreita e com a sua prática de economista ultraliberal, o ministro, ao propor limitar as faculdades de filosofia, sociologia e ciências humanas como um todo, em benefício do saber utilitário caminha no sentido de inviabilizar a capacidade de busca e de debate nas universidades, essencial ao seu modo de ser e de se fazer como instituições culturais fundamentais para o progresso humano. Trata-se de uma proposta de “escola sem partido” numa versão para universidades? O tal “marxismo cultural” a ser extirpado, elegido como bode expiatório, se traduz no ataque à filosofia e às ciências humanas?
Aqui cabe afirmar alguns pontos fundamentais para enfrentarmos mais este ataque à liberdade e à autonomia das universidades. Como humanos, dependemos uns e umas de outros e outras, e vivemos em troca permanente com a natureza. Criamos saber, cultura, filosofias e imaginários, ciência e tecnologia, que nos dão sentido de viver em coletividade e buscar o melhor. É um processo de busca tensionado por diferenças e oposições, mas que nos levam a associações e superações. Neste sentido, podemos caminhar para barbárie e nos destruir, como histórias passadas de sociedades pelo mundo nos ensinam. O amanhã e o depois estão em germe no hoje, mas condicionados pelo que somos e pelo passado que carregamos. Não há, nunca houve, uma predestinação. Sempre temos que decidir, acordar ou disputar, avançar ou recuar, fazendo o amanhã ou destruindo tudo. Isto exige busca coletiva, visões e filosofias, conhecimento científico e capacidade tecnológica, num enorme esforço coletivo permeado de contradições. Entender-nos sem nunca chegar ao fim nos leva a pensar e buscar. As universidades são alavancas que podem nos ajudar a mover-nos da melhor forma possível.
Isto tudo nos traz inquietações filosóficas fundamentais, permeadas por processos e relações sociais, culturais, políticos e econômicos em diferentes momentos históricos. Criamos convenções e códigos éticos, que dão orientação sobre nossos direitos e nossas responsabilidades individuais e coletivas. Novos desafios nos impõem nova busca de sentidos de viver e com ele a necessidade de atualizar nossos códigos éticos. Aqui cabe lembrar que são os mais brilhantes cientistas, nos mais diferentes domínios, que levantam as novas questões filosóficas e éticas para o viver humano. Isto explica o lugar central das grandes correntes de pensamento nas universidades mais dinâmicas. Há uma relação intrínseca entre ciência, tecnologia, filosofia e todas as ciências humanas.
Termino lembrando que temos muitos problemas e deficiências em nosso sistema universitário. Mas não vamos melhorá-lo priorizando o “treinamento” de profissionais de alto nível técnico  em detrimento de profissionais cidadãos conscientes da dimensão ética e política do seu engajamento para o bem coletivo.
Rio, 30/04/2019

Tradução »

jepe500

slot resmi

slot

slot dana

slot zeus

slot

rejekibet

88id

jkt8

slot pg

jayaslot

slot88

oppo500

toto slot

slot777

slot maxwin

jayaslot

slot maxwin

slot mahjong

slot

slot

INK789

slot zeus