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Código Florestal: uma festa de incentivos econômicos e isenções fiscais

Por Edélcio Vigna
texto originalmente publicado no site do Inesc
O Substitutivo ao Código Florestal aprovado pelo Senado Federal não vem para proteger as florestas, mas a agricultura, em especial, a de exportação. Por isso, traz o espírito produtivista de uma modernização conservadora e não acompanha o avanço tecnológico e científico. As propostas estão estacionadas entre o século XIX e o XX, quando a revolução agroquímica verde promoveu um avanço na produtividade à custa de uma insustentabilidade ambiental.
Agora, a “revolução verde” retorna embutida nos diversos projetos de lei e de códigos, como o Florestal, para sustentar a indústria criminosa de agrotóxicos. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) alertou que foram vendidos dez vezes mais agrotóxico que a área plantada, sem considerar o que é contrabandeado. Isso significa que o consumidor está sustentando o complexo agroquímico internacional e uma produção contaminada.
Esta irresponsabilidade para com o direito dos consumidores e da justiça tornou-se uma prática comum na moderna economia monetarizada, que não tem como base o princípio da precaução – se há incerteza científica, devem ser adotadas medidas técnicas e jurídicas para prevenir e evitar perigo de dano à saúde e ao meio ambiente. O economista François Chesnais afirma que “o período histórico em que estamos entrando será dominado pelo entrelaçamento entre as dimensões sociais e ecológicas das devastações provocadas pelo movimento de valorização do capital”. É neste contexto que se entende porque no novo Código Florestal existe tanto incentivo financeiro e econômico, tanto crédito, tanta isenção fiscal e de multas ambientais.
O texto ao instituir mecanismos de pagamento por serviços ambientais efetiva o mercado voluntário de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD), que negocia títulos de carbono nas bolsas de valor. A criação desse mercado, que sofre resistência de diversos setores sociais por não ter regras internacionais, está sendo regido por uma estratégia de implementação junto aos proprietários que conduz a política de “fato consumado”.
O Código, também possibilita a obtenção de crédito agrícola com taxas de juros menores e limites e prazos maiores que os praticados no mercado; utilização de fundos públicos para concessão de créditos reembolsáveis e não reembolsáveis destinados à compensação, recuperação ou recomposição das áreas cujo desmatamento seja anterior a 22 de julho de 2008; as instituições financeiras concederão crédito agrícola para as propriedades inscritas no Cadastro Ambiental Rural; Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal vão gerar créditos tributários que serão deduzidos da base de cálculo do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR).
A lei implementará programas para conversão das multas destinado aos imóveis rurais que promoveram desmatamentos sem autorização até 22 de julho de 2008; as sanções e multas estabelecidas no Programas de Regularização Ambiental serão convertidas em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente; concederá isenção de impostos para os principais insumos e equipamentos, tais como: fios de arame, postes de madeira tratada, bombas d’água, trado de perfuração de solo, para recuperação e manutenção das áreas de preservação e de reserva legal. Essa isenção de impostos chega a ser ofensiva, pois insumos, como os agrotóxicos, já contam com redução de até 60% do ICMS e isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), PIS/Pasep e Cofins.
Os programas de compensação financeira aos proprietários que desmataram ilegalmente terão impacto junto aos recursos do Tesouro Nacional, pois há gastos administrativos que são executados pelo órgão competente. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) estuda um decreto para transformar em advertência as multas das pequenas infrações ambientais de até R$ 2 mil, pois o custo de cobrança judicial de um processo é cerca de R$ 4.379,00. Como existem no órgão aproximadamente 115 mil processos o custo total para administrá-los é de R$ 503,9 milhões e destes somente R$ 2,4 milhões (0,48%) são arrecadados.
O argumento do relator de que “a inclusão de instrumentos (financeiros) inovadores, os quais poderão induzir a construção de uma nova consciência, (…)”, não corresponde ao moderno conceito de tomada de consciência sobre os direitos da Natureza em discussão na ONU. O Direito à Natureza, um novo conceito incorporado pela Bolívia na “Lei da Mãe Natureza”, conta com apoio de políticos e grupos sociais e significa uma redefinição de direitos.
O texto aprovado no Senado Federal, por ter sido modificado, retornará à Câmara dos Deputados que revisará o documento e votará as alterações realizadas. O acordo entre governo-ruralistas-base de apoio é forte politicamente e fraco socialmente. A sociedade tem demonstrado que não conhece a proposta, que leis que afetam o futuro do país devem ser mais bem discutidas e com tempo de maturação e apreensão de toda população. O tempo dos ruralistas de plantar, colher e comercializar, não é o tempo da sociedade que deseja um ambiente socialmente saudável e alimentos seguros e não contaminados.
O Comitê de Florestas, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Associação Brasileira de Ciência (ABC) a Conferencia Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e outras organizações que defendem os direitos socioambientais, entre elas o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), continuarão a pressionar os parlamentares e recorrendo ao senso de justiça democrática da presidenta Dilma Rousseff.

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