Rio de Janeiro 24 de novembro de 2014
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Por Camila Nobrega
Do Canal Ibase

Os BRICS estão ainda em sua “infância”, como definiu Karen Smith, da Universidade de Cape Town, na África do Sul. Mas, enquanto isso, ações comuns importantes estão sendo criadas entre os cinco países que compõe o bloco – Brasil, Índia, África do Sul, China e Rússa – sendo a principal delas a criação do Banco dos BRICS, anunciado em julho deste ano, com sede em Xangai. Quais são as potencialidades deste bloco? Em que medida ele representa um arranjo contra-hegemônico no cenário mundial? E como a sociedade civil pode influenciar nesta construção?
Estas foram algumas das perguntas que nortearam o seminário “Os Brics e as novas formas do poder global”, ocorrido nos dias 17 e 18 de novembro, no Museu da República, no Rio de Janeiro. O evento foi realizado pelo Ibase, em parceria com o Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp/Uerj),com objetivo de fazer uma reflexão sobre as novas configurações do poder global, com destaque para os BRICS.
Como uma das palestrantes no primeiro dia do seminário, a sul-africana Karen Smith explicou por que ela se refere aos BRICS como uma criança nos primeiros anos de vida e afirmou que este é o momento de ampliar o debate, para que o bloco de países não represente apenas interesses no nível dos governos, mas responda também a demandas da sociedade civil: “O discurso sobre os BRICS ainda circula em poucos fóruns privilegiados, a sociedade civil tem o papel de pressionar e de democratizar esse debate.”
Smith ressaltou que a parceria entre ONGs, universidades e movimentos sociais será necessária para que de fato se disputem estratégias e significados sobre os BRICS. Este ponto, aliás, retornou à mesa diversas vezes, a partir de um ponto de consenso: o bloco de países se apresenta como uma alternativa contra-hegemônica, mas, na verdade, está completamente inserido em uma lógica internacional na qual países em desenvolvimento têm relações fortes de dependência com a estrutura atual do capital financeiro.
Luis Manuel Fernandes (PUC-Rio/UFF) afirmou: “Os Brics não são uma ruptura sistêmica, uma nova Guerra Fria. Há críticas à geopolítica mundial comuns aos países do bloco, mas há também diferentes interesses entre eles. Precisamos entender melhor o que queremos e que pode ser construído em conjunto. Nesse ponto, a sociedade civil tem o papel de colocar formas de emancipação que não estão colocadas entre os governos. Mas há limites, é um projeto reformista”
Adriana Abdenur, do Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio falou especialmente sobre a China. Ela ressaltou a diferença entre o discurso político de multilateralismo e a prática. A China, disse Abdenur, aposta em acordos bilaterais, onde relações assimétricas ficam claras: “O Fórum de Cooperação África-China, por exemplo, na prática, é feito de relações bilaterais. A China se coloca como um país emergente em seu discurso, mas exerce poder de uma potência mundial.”
Redução das desigualdades não acompanha taxas de crescimento
Na Índia, a economia cresce, mas a desigualdade no acesso à riqueza permanece. Surajit Mazumdar, da Universidade Jawaharlal Nehru ressaltou que o setor privado viveu um boom desde os anos 1990 e que o setor público se reatraiu. Como resultado, ele mostra que os salários dos trabalhadores não acompanharam o aumento das taxas de lucro das empresas, nem isso se tornou fonte de autonomia em relação a outros países. “A Índia tem que descobrir como reduzir sua dependência dos Estados Unidos, a margem de mudança nesse sentido esta muito pequena.
José Maurício Domingues, do Iesp/ UERJ, aprofundou sua fala sobre as características das relações de poder entre os países do Sul e do Norte hoje e ressaltou a dependência estrutural das economias: “Precisamos entender dinâmicas complexas no cenário internacional. Em termos tecnológicos, por exemplo, o Brasil importa muito dos Estados Unidos. Engenheiros indianos trabalham muitas vezes para empresas norte-americanas. Ou seja, se houve uma cooperação tecnológica Brasil-India, precisamos perceber que os BRICS por si só não eliminam as relações de dependência já existentes”.
Moema Miranda, diretora do Ibase, chamou a atenção para um fato que fala por si próprio. Em uma mesa que tinha como tema a sustentabilidade, nenhuma das
falas foi norteada pela relação da sociedade com o meio ambiente: “Acho bastante sintomático que isso tenha ocorrido. Está bem claro que está pauta não está colocada nos BRICS e que nem a sociedade civil está colocando o assunto como prioridade. Precisamos entender de uma vez por todas que o crescimento não é ilimitado. Vivemos em um planeta, e ele tem limites.”

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