Cândido Grzybowski
Sociólogo, diretor do Ibase
Há um mal-estar no ar bastante estranho. O intenso calor sem chuvas contribui, mas não explica a sensação de estarmos sendo levados à beira de um ataque de nervos. Há um quê de dificuldades aumentando no nosso ir levando a vida cotidiana, algo que tem a ver com o poder público, o espaço público, a expressão pública, a circulação na cidade como um bem comum à disposição de todas e todos. As carências já exacerbadas aparecem ainda maiores. Aí o desconforto vira desencontro. A normalidade vira anormalidade. O estresse político se instala, e aí… o pior pode acontecer.
Aqui no Rio estamos sendo agredidos por uma intervenção urbana que está pondo a cidade de pernas para o ar. Ir de um canto a outro virou tarefa difícil de encarar. Não é pelos blocos de Carnaval, que são, aliás, grandes amortecedores do estresse coletivo. É por causa de obras impostas à cidade por governantes que decidem autoritariamente, sem discussão, o que é bom para nós, cidadãs e cidadãos, que vivemos aqui. Os transportes públicos já funcionavam mal e foram o motivo de grandes mobilizações. Agora eles estão simplesmente horríveis. Nenhuma previsão, em curto prazo, de que venham a melhorar.
Mas é o clima de desgoverno na questão da segurança pública que alimenta mais o estresse político. A prática da justiça pelas próprias mãos está em alta. As milícias privadas, criminosas mas toleradas pelo poder público, parecem que fizeram escola, e grupos já se organizam em diferentes lugares e agem sem medo. Até prenderam um garoto num poste, pelo pescoço e nu, como se cachorro fosse! Mas sejamos claros a respeito, acima de tudo, quem faz justiça pelas próprias mãos e pratica a violência sem controle é a polícia militar, exatamente quem deveria ser a guardiã da segurança. Quanta mobilização com depredações e incêndios de ônibus em áreas populares por causa do desmando da polícia! Alguém sabe a conta de assassinados pela polícia  no Rio e São Paulo, nossas maiores metrópoles, neste início violento de 2014? Não adianta se esconder atrás de UPPs – como aqui no Rio faz nosso Secretário de Segurança e a grande mídia –, pois a instituição polícia é a mesma, nada pacificada, nada cidadã, com tratamento de guerra aos suspeitos e tolerância generosa aos seus próprios quadros violentos. Não dá para pacificar favela se a própria favela não é aceita como forma de cidade, mas sim vista pela polícia como antro do crime. A polícia ataca, atira, tortura, sobretudo onde vivem pobres, negros(as) e excluídos(as) de direitos fundamentais de cidadania. E quando criminosos assassinam policiais – algo intolerável numa democracia –, ao invés de investigar e prender para julgar, a polícia, como exemplo (para quem?), multiplica assassinatos sem critério e em série de supostos criminosos(as). Não importa que além disto as tais balas perdidas matem quem simplesmente vive na “área perigosa”.
Pior de tudo, porém, é algo da esfera do poder. Há algo geral, sutil e ardiloso, que vem do poder central, do Congresso, do Executivo e do nosso Judiciário, com apoio da grande mídia, que está alimentado sordidamente o estresse político. O assunto é o controle das manifestações da cidadania nas ruas e praças. Aqui é o próprio direito de exercer cidadania que está em questão no modo como o debate se implantou e prospera.
Existem, claro, excessos e violências praticadas por grupos minoritários nas manifestações que explodiram em junho de 2013. A violência nada tem a ver com cidadania numa democracia, que isso fique claro! A legítima prática da desobediência civil pacífica virou pancadaria, dada a opção de certos grupos, como os “Black Blocks”, pela violência direcionada a símbolos do poder dominante. A coisa degenerou e acabou afetando as legítimas mobilizações cidadãs, que perderam em capacidade de mobilização, adesão popular e impacto político. A violência parece sem controle. Porém é forçoso reconhecer mais uma vez que, mesmo não sendo todo o problema, a polícia é parte intrínseca dele. Não só ela revelou a sua incapacidade de investigação sobre quem são os tais pequenos grupos violentos, como também sua incapacidade operacional, pois só sabe lidar sendo violenta, com uso de bombas, tiros e prisões arbitrárias, alimentando o ciclo vicioso.
Mas transformar isto que assistimos em atos de terrorismo já é demais! Que estresse! Lamentável que tenhamos mortes a chorar, não importa de que lado. Porém não estamos diante de ataques terroristas. Terrorismo é o que se quer criar através de iniciativas legais. Acima de tudo, precisamos distinguir o joio do trigo: garantir o direito à manifestação da cidadania, em sua diversidade de identidades, contradições e motivações, fortalecendo a própria cidadania, sem medo de radicalização da democracia. Ao mesmo tempo precisamos mudar a polícia para que ela mesma seja cidadã, use a lei de forma civil e pacífica para controlar as expressões não-cidadãs, que ameaçam os direitos democráticos de todas e todos. Leis já temos, que se apliquem!
Mas então por que o medo no ar? Difusamente parece que corremos o risco de ir para trás ao invés de avançar. Precisamos de mais democracia, mais direitos, e não de repressão. Vamos garantir direitos de cidadania. No processo de avanço democrático, a própria repressão vai acabar sendo desnecessária. E a gente supera o estresse político… Bem, temos eleições neste ano para pautar isto e decidir para onde vamos, com menos estresse, pelo menos.
Rio, 25/02/2014

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