Itamar Silva, diretor do Ibase
Especial para o site do IAB
É com orgulho cidadão que tomo conhecimento do manifesto do IAB, intitulado “O Direito à cidade e o instituto de arquitetos do Brasil”. Uma Agenda necessária e que está em sintonia com as vozes que vêm das ruas. O grito das manifestações clama por transparência, acesso à informação e efetiva participação, o que podemos traduzir livremente como controle social sobre o que é público.
Destaco para um breve comentário o item que trata de Transparência e Projeto e tomo um atalho para ilustrar o fato a partir da minha experiência no Rio de Janeiro. Para nós que militamos e trabalhamos com o tema da favela e com o da ocupação do espaço urbano na cidade, é antiga a demanda por maior controle e transparência na relação projeto-execução de obra. São múltiplos os exemplos pretéritos e recentes em que projetos são alterados e custos majorados exponencialmente em razão de uma certa “promiscuidade entre projeto e obra”.
Tomemos como ponto de reflexão o PAC Favelas e o Morar Carioca, ambos no Rio de Janeiro.
Duas iniciativas que respondem diretamente a uma pressão antiga do movimento de favelas e urbanistas. “Nunca antes” se teve um volume de recursos públicos tão alto aplicados diretamente em áreas de favelas no Rio de janeiro. É verdade também que ambas iniciativas deram passos importantes conceitualmente falando, na medida em que incorporaram em suas definições a Favela como parte da cidade. No entanto, ao mesmo tempo em que trazem inovações e avanços, repetem velhos vícios e ampliam brechas para “reajuste e superfaturamento – fator estimulante da corrupção”.
Há anos que “para agilizar processos” o poder público trabalha com a lógica de licitar projetos básicos ou anteprojetos. Mas obra não se faz com anteprojeto e nem mesmo com projeto básico. Para se dimensionar uma obra e definir claramente seu custo, é necessário o projeto completo, detalhado. Isso é que garantirá que os custos definidos nessa fase estejam muito próximos do que será executado. Daí a importância de se garantir os recursos necessários para o custeio de Projetos Completos. “As obras públicas devem ser licitadas somente a partir de Projeto Completo. Quem projeta não constrói”. Esse deve ser o compromisso público.
Então, retomando o tom que vem das ruas e buscando “alcançar isenção e autonomia entre projeto e obra”, a atual etapa de contratação no âmbito do Morar Carioca deveria assumir este compromisso, viabilizando o detalhamento dos projetos ora contratados e deixando explícito que está em sintonia com o posicionamento do Instituto dos Arquitetos do Brasil: licitação somente a partir de Projeto Completo. Talvez esse procedimento contribua para diminuir a descontinuidade das obras públicas, principalmente em favelas, pois abre maiores possibilidades de monitoramento pela sociedade civil.