Rio de Janeiro 5 de março de 2015
Por Tábata Lugão
Assistente Social e pesquisadora do Ibase

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Quando começamos o projeto #Maisvaldariosa, em 2013, a curiosidade para saber o que somos e iríamos fazer mobilizava e atraía em torno de 50 moradores para uma das primeiras ações que propomos: os “Encontros de Diálogos”, que tinham como finalidade a pesquisa qualitativa sobre o local e seus habitantes. Atualmente oficinas com assuntos de interesse declarado pelos mesmos à época da pesquisa, como o tema Meio Ambiente e a construção de espaços de convivência, reúne menos que a metade desse contingente. Claro que isso acontece quando se trata de adultos, pois as crianças são empolgadas e empolgantes e não precisam de convite: lotam as atividades.
O projeto #Maisvaldariosa, realizado pelo Ibase em parceria com o Instituto de Estudos de Trabalho e Sociedade (Iets) e o Metrópole Projetos Urbanos (MPU) e financiado pela Caixa Econômica Federal (CEF), tem como prioridade em todas as atividades que realiza estimular a participação dos moradores do conjunto habitacional. No entanto, das 1500 famílias moradoras do local poucas se dispõem a participar das oficinas e encontros promovidos pela equipe do projeto. Para quem não conhece a proposta, o #Maisvaldariosa tem como objetivo construir, com a população local, um Plano de Desenvolvimento Local Integrado Sustentável, visando a melhoria da qualidade de vida dos moradores do conjunto e melhora na qualidade de vida.Na mobilização dos moradores são utilizados vários recursos: faixas, cartazes, prospectos, carro de som, grupo de palhaços, e, uma ferramenta fundamental: muito bate-papo!
Seja em Valdariosa ou em qualquer área de periferia, favela, ou mesmo nos condomínios luxuosos da Zona Sul, a participação dos sujeitos afins é emblemática, mas nas atividades de cunho social em áreas mais pobres se percebe isso de maneira diferenciada. O fato é que entre um projeto de interesse social e outro observa-se a mesma dificuldade. Há, aparentemente, uma ferida profunda na população, difícil de sarar, tamanho é o descrédito que se tem referente ao poder público e a desconfiança no outro, seja ele quem for (empresas, liderança locais, ONGs etc). Um histórico de programas que não tiveram conclusão ou que não respeitaram os anseios/desejos das pessoas abriu essa úlcera na sociedade.
Claro que há, também, questões pessoais dentro da conjuntura do local que fazem com que as pessoas não queiram ou não se motivem a participar. No caso do conjunto habitacional enfrentamos problemas com os vizinhos, com o síndico, com o subsíndico, ou insatisfação individual com a mudança de moradia, por diversos fatores (falta de costume com as regras condominiais, saudade da antiga casa, rompimento de vínculos com amigos e familiares do antigo local de moradia etc.). Existe ainda a insegurança. Percebemos em alguns uma certa vergonha em se envolver, às vezes por timidez, outras por não se achar competente para tal, inclusive, por falta de estudo (não saber ler uma apresentação em slide, não saber assinar uma lista de presença), criando um distanciamento.
A tática, então, precisou ser invertida para alcançar o sucesso. Em vez de chamá-los a vir até nós, vamos até eles. É necessário reconquistar e reanimar o desejo de se unir e expor sua voz.
Habitualmente já é difícil aproximar mulheres para conversar sobre temas tabus como sexualidade, ou que assustam como a violência contra a mulher. Além da pouca estrutura oferecida pelo Condomínio Habitacional Minha Casa Minha Vida de Valdariosa, o calor de janeiro ajudou a esvaziar as reuniões. Assim, a equipe da Camtra (Casa da Mulher Trabalhadora), que participa da agenda de ações do projeto #maisvaldariosa no eixo Protagonismo da Mulher, levou a campo uma barraca enfeitada e expôs todo o seu material educativo (além de atrativos como um suco gelado e um jogo com brinde). A – “Tenda de Direitos da Mulher” aproximou mais de 100 mulheres moradoras do local em duas tardes de atividade e conseguiu reuni-las em um debate sobre direitos das mulheres, violência e racismo, com distribuição de material informativo e preservativos.
Cada público exige uma forma diferente de comunicação,. Ainda mais em um processo de aproximação, é necessário primeiro criar os vínculos para depois se preciso fortalecê-los em momentos mais formais.
A iniciativa das técnicas da Camtra foi louvável, e outras equipes do #maisvaldariosa estão tomando o mesmo caminho para que a informação chegue ao maior número de moradores(as) possível.
“Olha as crianças sorrindo
Consegue ver o seu brilho?
Há esperança surgindo
No espetáculo de domingo!”
“Veja a luz da lua
Veja a luz da rua
A escuridão é morada
Mas há luz na arquibancada”
Ser eu…em Valdariosa
Quando entro em um trabalho, seja ele qual for, me doo de coração. Sou assistente social formada na Escola de Serviço Social da UFF, desde 2009. Mas em vacas magras já fui camareira e recepcionista de hotel, já fui vendedora e digitadora em eventos de moda, e recepcionista de salão de beleza…. Gosto, acima de tudo, da liberdade que o trabalho dá a uma mulher, pois não faço o tipo “do lar”, apesar de saber cozinhar e alguns pratos saírem muito bons!
Desde o primeiro projeto que trabalhei como profissional da minha área eu me entrego com o propósito de aprender – com os colegas e com a população atendida . Ser cada vez mais compreensiva e entender mais a dinâmica social também é uma prática constante, pois no papel de mobilizadora social, articuladora e educadora, quando lidamos com as mais variadas personalidades e todo um contexto histórico.
Quando cheguei em Valdariosa, cheguei cheia de sonhos… Meu imaginário dizia: “Nossa, esse projeto é incrível! Vai ser o primeiro trabalho que vou mobilizar, estudar, executar e concluir as ações….” Pois que a responsabilidade de todo o processo, assim como os recursos, estavam nas mãos das instituições contratadas e confiava, e confio, nas pessoas que o coordenam.
Nas experiências anteriores, com os projetos “Água para Todos”(Cedae – cidade do Rio), “Morar Carioca” (Prefeitura do Rio), e “Projeto de Educação Ambiental – PEA” (Cedae – Duque de Caxias), todo o empenho foi por “água abaixo”, pois não concluíram os empreendimentos prometidos e o trabalho social foi abandonado.
Além disso, Valdariosa me acolheu. Levo em média quatro horas para chegar da minha casa, em São Gonçalo, até o bairro! São três conduções para ir e quatro para voltar (se eu quiser encarar a ponte Rio-Niterói sentada). Mas, apesar de diversas dificuldades que o projeto já passou, como por exemplo atrasos de liberação de recursos, a população nos acolhe. A realidade do viver em um conjunto habitacional do MCMV é tão diferente do que qualquer campanha eleitoral possa transparecer, que atrai os trabalhadores da área social como imãs.
É uma diversidade de fatores que despertam o desejo da luta por direitos…

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