Do Ecodebate
Representantes de agricultores familiares, quilombolas, ribeirinhos e atingidos por barragem participaram, ontem, de audiência pública na comissão especial que analisa a proposta do novo Código de Mineração (PLs 37/11, 5807/13 e quatro apensados).
Eles lotaram o plenário da reunião, levaram faixas e foram unânimes ao criticar o foco “economicista” da atividade mineral e de sua legislação atual. Os participantes consideram que o privilégio ao aspecto econômico dominaria o projeto de novo Código de Mineração, que tramita na Câmara com urgência constitucional.
Propostas concretas
O Comitê Nacional em Defesa dos Territórios frente à Mineração, do qual o Ibase faz parte, apresentou três propostas concretas para garantir a chamada “pegada socioambiental” ao novo Código de Mineração:
* um zoneamento mineral que impeça essa atividade em corredores ecológicos, mananciais e territórios de populações tradicionais;
* a antecipação do licenciamento ambiental, para que passe a ocorrer antes do processo de licitação das lavras;
* e a ampliação do conceito de “impactados pela atividade mineral”.
Para o representante do comitê, Raul Silva Telles do Vale, o marco mineral deve reconhecer que são impactados não apenas os vizinhos da mineração, mas todos os que estão na cadeia mineral. “É fundamental trazer critérios para que eles possam ser devidamente compensados também”.
O representante da Coordenação Nacional das Comunidades Quilombolas (Conaq), Denildo Rodrigues de Moraes, defendeu o direito de veto das populações tradicionais quanto à mineração em seus territórios. Segundo a Conaq, empresas mineradoras já apresentaram pedidos de concessão de lavra sobre 98% das atuais terras quilombolas.
Consulta pública
Integrante do Movimento Nacional pela Soberania Popular frente à Mineração, Maria de Lurdes Souza reclamou ainda que “a voz das comunidades tradicionais” não é devidamente ouvida nos processos de consulta pública: “A gente se posiciona contra um determinado empreendimento, constata que outros integrantes da comunidade também foram contra, mas, quando vê, o empreendimento é concretizado assim mesmo devido à força do poder econômico”. Ela também reclamou que a atual legislação privilegia os interesses estrangeiros sobre as riquezas naturais brasileiras.
Maria de Lurdes é agricultora familiar do norte de Minas Gerais, já visitou vários municípios mineradores e considera que a proposta só vai inovar, de verdade, se dirigir seu foco para a diminuição dos impactos sociais e ambientais da atividade mineral.
“Eu olho para a minha serra hoje, a Serra Geral, e falo com meus filhos: ‘apreciem o quanto vocês puderem porque a destruição ali vai ser fatal’. Fomos a Paracatu (MG) e a Ilhéus (BA) e isso traz para a gente um sentimento de tristeza de como estão abandonados aqueles locais. A gente vê o nosso Estado omisso, sem saber como essas famílias estão vivendo e só falando de ‘royalties e royalties’, que a gente nem sabe o que é isso. Até porque, nós, agricultores, não temos que entender disso. Nós entendemos que natureza é bom para a vida de todos. E onde é que está esse respeito?”
O representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Dom Guilherme Antonio Werlang, fez um apelo aos congressistas para que “ouçam as reclamações das comunidades” a fim de que a votação da matéria leve em conta o interesse social e não apenas o poder econômico. “A atividade mineral gera impacto e conflitos em toda a cadeia, com degradação socioambiental, concentração privada da riqueza e distribuição igualitária dos impactos”, afirmou.