Por Ibase
Foi no Centro Cultural Donana, em Belfort Roxo, que a banda Cidade Negra surgiu, em meados da década de 1980. Soube disso ontem, nas apresentações do músico Dida Nascimento e os rappers Slow e Dudu do Morro Agudo, que contaram esta e outras histórias no Espaço Cultural Sylvio Monteiro, belo casarão amarelo no Centro de Nova Iguaçu.
Os jornalistas de cultura talvez saibam dessa história e conheçam o Centro Cultural Donana, uma referência local, mas arrisco dizer que informações sobre ações culturais na Baixada circulam pouco, de modo geral. Uma pena, pois não falta criatividade na região, como revelou o “Mapeamento dos Grupos Criativos da Baixada Fluminense” (disponível para download em “Midiateca”/”Pesquisa”), resultado do Programa Brasil Próximo – ação de cooperação internacional Brasil-Itália que contou com a coordenação do Ibase e do Se essa Rua Fosse Minha e apoio de várias organizações da sociedade civil. O relatório final do Mapeamento foi lançado No Espaço Cultural, após os shows de Dida, Slow e Dudu.
Ao todo a pesquisa listou 331 iniciativas culturais, das quais 115 formados por jovens dos 13 municípios que formam a Baixada. Os grupos desenvolvem trabalhos artísticos que vão da dança ao circo, passando por música, carnaval, teatro, literatura, entre outras linguagens. Além de dar visibilidade às ações culturais, o mapeamento oferece um panorama da situação da atividade cultural na região, o que faz deste estudo um documento importante para o poder público pensar estratégias que possam alavancar a atividade criativa local.
Os jovens que participaram do evento não deixaram de dar seu recado, aproveitando a presença de representantes da Prefeitura e do Programa Brasil Próximo, cujo objetivo é fomentar processos de democracia participativa e políticas sociais em diferentes territórios do país.
“Nasci e cresci na Baixada Fluminense. Adoro ser jovem aqui, tem muita gente criativa e muita ação interessante. Mas há problemas também, especialmente de infraestrutura. Eu trabalho em uma organização que oferece formação em circo e ter que encontrar um espaço para espetáculos aqui não é fácil. A lona mais próxima está interditada”, contou Ritihianne Barbosa, 17 anos.
A denúncia de Rithianne encontra respaldo na pesquisa, que mostrou que um dos principais problemas da região é a falta de equipamentos culturais, ao lado da sustentabilidade financeira. Entre os grupos ouvidos, 69,91% responderam que a falta de locais de apresentação dificultam o trabalho e 90,27% apontaram a sustentabilidade financeira.
Para não deixar a peteca cair e fazerem as apresentações, mesmo faltando espaço e dinheiro, os grupos ocupam as ruas da Baixada e ativam o “gogó” para pedir “doações de comerciantes locais” que, na pesquisa, aparece com maior índice (58,8%) no quesito “Estratégias de sustentabilidade e manutenção das atividades”, seguido por “ações comunitárias, como bingo, rifas etc.” (36%).
Para se ter uma ideia da falta de infraestrutura, nos 13 municípios que compõem a Baixada Fluminense e por onde circulam quase 4 milhões de pessoas, das quais pouco mais de um milhão são jovens, há apenas 34 bibliotecas, três museus, 11 teatros e oito centros culturais.
“A falta de equipamentos culturais da região afasta possíveis financiadores, que querem visibilidade para o público. Se não tem local de apresentação, como vão exibir peças de marketing? Se apresentar na capital também é inviável porque transporte é caro”, observou Silvia Machado, produtora cultural que trabalhou na pesquisa e fez a apresentação dos dados durante o lançamento do Mapeamento, que continuará a ser feita por meio de uma plataforma virtual, a Desenrolo!
A plataforma vai funcionar, na verdade, como uma revista eletrônica colaborativa sobre cultura na Baixada e, também como um banco de dados disponível para o público, alimentado pelos grupos de cultura local. “A plataforma já está no ar e vai funcionar como uma mídia de articulação e comunicação entre os grupos locais. Acessando a Desenrolo – a revista de cultura e juventude da Baixada Fluminense, o público vai saber tudo que está acontecendo em termos de cultura na região, por meio de publicação de reportagens feita pelos jovens da Baixada, e também terá a acesso a um banco de dados sobre os grupos criativos”, contou a jornalista Aline Rochedo, editora da Desenrolo.
Durante o evento, foram realizadas oficinas e uma apresentação de tambores de maracatu, além dos shows dos músicos já citados.
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