Athayde Motta, antropólogo, diretor do Ibase e membro da diretoria executiva da Abong
Convocada pelo governo da França, a Cúpula por um Novo Pacto Financeiro Global acontecerá em Paris nos dias 22 e 23 de junho. Além de encontros entre mais de 100 chefes de Estado, está prevista a participação de mais de 40 organizações internacionais e cerca de 120 ONGs e coalizões de ONGs de todo o mundo. A Associação Brasileira de ONGs (Abong) estará presente no evento como parte do Comitê Executivo do Forus, uma rede global que reúne 67 plataformas nacionais de ONGs e sete coalizões regionais que congregam mais de 22 mil organizações. Junto com Pedro Bocca, assessor internacional da Abong, estarei presente como membro da diretoria executiva da instituição e diretor do Ibase.
O principal objetivo do encontro é construir um novo consenso global em torno de um sistema financeiro internacional mais inclusivo. Questões como a crise climática, a pandemia da Covid-19 e o crescimento recorde da dívida externa em todos os países têm contribuído para um quadro de volatilidade financeira cujos principais impactos são a reversão da tendência de diminuição da pobreza global, o fracasso dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e a incapacidade de reduzir os níveis de aquecimento global.
A Cúpula por um Novo Pacto Financeiro Global também permitirá discussões sobre as condições necessárias para atingir a sustentabilidade e reduzir a pobreza por meio de políticas e acesso a recursos financeiros que enfrentem as mudanças climáticas, a perda da biodiversidade e a degradação ambiental. Serão abordadas, ainda, agendas que serão discutidas em sua totalidade na reunião de líderes do G20, em setembro, na Índia, e na COP28, nos Emirados Árabes Unidos. Um dos temas mais polêmicos é a agenda de reformas de instituições financeiras internacionais, que, de acordo com alguns especialistas, inclui as instituições financeiras de desenvolvimento e os bancos multilaterais de desenvolvimento.
Agenda da sociedade civil
Para algumas organizações que participarão do encontro, é preciso mobilizar recursos financeiros e políticos consideráveis para lidar com os múltiplos desafios colocados pela atual crise do sistema financeiro internacional. Os países ricos têm falhado em cumprir suas promessas de financiar programas de desenvolvimento que auxiliem países menos desenvolvidos a lidar com a crise climática e com o aumento da pobreza. É necessário mobilizar recursos que reformem estruturalmente a arquitetura financeira internacional. Nem todas as soluções recomendadas pelos países ricos são aprovadas pelas sociedades civis do Sul Global. Medidas como o investimento na infraestrutura verde e estimular o crescimento do setor privado em países de baixa renda tem sido criticadas como meios que privilegiam o acúmulo de riqueza entre atores públicos e privados do Norte global, aprofundando as desigualdades com os países do Sul global.
Campanhas têm sido implementadas por várias redes de OSCs globais lidando com temas tão variados como a supertaxação das empresas de petróleo, consideradas como algumas das mais poluentes do planeta; a reforma dos bancos multilaterais de desenvolvimento; e a reforma da arquitetura financeira global. Há também críticas quanto as perspectivas de que essa Cúpula atinja os ambiciosos objetivos a que se propõe. Um documento provisório preparado pelos organizadores da Cúpula e que vazado sugere que a maior parte das questões permanece sem resposta e não há sequer a clareza que haveria uma declaração formal ao final do evento. O documento também mencionaria investimentos da ordem de US 100 bilhões por ano em garantias para os países de baixa renda. No entanto, promessas de quantia semelhante em anos anteriores não foram cumpridas.
Em outra iniciativa, 70 economistas internacionais apoiam a criação de um imposto internacional sobre transações financeiras. As estimativas são de que poderiam ser arrecadados cerca de EUR 260 bilhões por ano se o imposto fosse aplicado a todos os países do G20. Outras propostas similares incluem uma taxa sobe a importação de petróleo, uma taxa para navios e aviões sobre sua pegada de carbono e uma outra taxa sobre a extração de petróleo.
A oportunidade de debate está dada. E trata-se sim de um esforço necessário e urgente. Aguardemos para saber se os resultados serão tão grandiosos quanto os objetivos até agora divulgados.
Foto: Samuel Tosta/Arquivo Ibase.