Com a eleição de Wania Sant’anna para a presidência do Conselho de Governança do Ibase, a instituição passa a ser uma das poucas organizações da sociedade civil a ter direção política e executiva formada totalmente por pessoas negras. Além de Wania, Athayde Motta e Rita Corrêa Brandão são afrodescendentes e fazem parte de uma política de diversidade que sempre foi valorizada no Ibase. “Em país com as características que o Brasil tem, de racismo e discriminação racial, não é trivial ter uma mulher negra na Presidência do Conselho de uma instituição com a história de atuação do Ibase tem. E é muito menos trivial que não seja apenas eu nessa posição, mas estar acompanhada de dois diretores negros, um homem e uma mulher, o Athayde Motta e a Rita Brandão” – explica Wania Sant’Anna.
A tarefa de estar à frente de uma instituição com mais de quatro décadas de existência não assusta a historiadora: “Se eu me sinto preparada? Sim, eu me sinto preparada. Eu nunca deixei de dizer que o Betinho me preparou para quase tudo o que diz respeito à minha vida profissional, não foi um privilégio ter tido ele como exemplo de vida, mas foi, sem dúvida, algo no terreno do Divino. Não só ele, mas todas as pessoas que trabalharam no Ibase ao início da minha carreira. Mas eu me sinto ainda mais preparada, isso sim, por estar na companhia da Rita, do Athayde e isso porque nós três sabemos que, nossa responsabilidade é, nesse momento, tem duas dimensões – administrar legados e construir algo novo e esse novo tem a ver com quebrar estereótipos e enfrentar o racismo como ele deve ser enfrentado – ou seja, com disposição política e muito respeito às gerações futuras”.
Leia entrevista de Wania Sant’anna sobre a importância do Censo Demográfico no Brasil
Sobre a liderança negra no Conselho e na Direção do Ibase, Wania Sant’Anna complementa: “Nós tivemos a oportunidade de falar sobre esse ineditismo em nosso Conselho, tivemos a oportunidade de ouvir o Cândido Grzybowski , ex-presidente do Conselho e diretor do Ibase, por muitos anos. Enfim, nós tivemos a oportunidade de refletir sobre o quanto essa composição era tanto simbólica quanto expressão do espírito de transformação que o Ibase sempre se propôs a empreender. Mas, entre o que nós podemos refletir como instituição e o que é a prática dessa direção negra em um país racista, existe muitas camadas para comentar. Eu penso que podemos servir de exemplo para outras organizações não governamentais. Penso também que estarmos os três juntos é algo especial porque nós temos esse histórico de carreiras profissionais iniciadas ou consolidadas no Ibase, nós conhecemos os nossos parceiros e penso que esses nossos parceiros poderão nos olhar como pessoas negras que se dispuseram a estar nesse lugar que não é apenas de comando, mas de reconhecimento, de compromisso com a instituição” – acredita a presidenta Wania Santanna, que atuou em vários projetos do Terceiro Setor, em empresas privadas e públicas e hoje é uma das participantes da Coalizão Negra por Direitos.
Para Cândido Grzybowski, “a experiencia da transição foi um sucesso, um caso exemplar de construção de uma liderança negra à frente do Ibase. Depois que deixei a direção geral, fiquei como assessor e posteriormente assumi a presidência do Conselho, chegando agora o momento de deixar também esse cargo e me tornar associado ao Ibase, como tantos que já fazem parte desse grupo maior de apoiadores”.
O sociólogo esteve à frente do Ibase por mais de duas décadas e assumiu o comando da instituição após a morte de Herbert de Souza, sendo responsável pela participação da instituição no Fórum Social Mundial e em discussões globais sobre governança e sustentabilidade do planeta. “Atualmente, continuo com meus grupos de análise de conjuntura com companheiros do Inesc, Fase, Action Aid Brasil. Também participo de um grupo chamado Renovação do Fórum Social Mundial, que conta com Roberto Savio, da Itália; Boaventura de Sousa Santos; de Portugal; e Norma Fernandez, da Argentina; além de outros. Cândido Grzybowski também está envolvido em uma consultoria para a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) sobre o enfrentamento da pobreza e a valorização da agricultura familiar no Brasil de 2002 a 2016, durante os governos petistas.