Cândido Grzybowski
Sociólogo, diretor do Ibase
Na quinta feira, dia 2 de junho, a presidente Dilma Rousseff lançou o programa que visa a erradicação da miséria, uma de suas promessas quando eleita. Num momento político difícil, com a crise que envolve o ministro da Casa Civil, a reafirmação de um governo ativo, responsável, que irá atrás dos e das invisíveis pela total exclusão a que são condenados, integrando-os a padrões mínimos de cidadania, merece reconhecimento e apoio de organizações de cidadania ativa como o Ibase.
Afinal, como dizia o Betinho, um dos fundadores e principal inspiração do Ibase, a fome e a miséria não podem esperar. Ações emergenciais de salvação de vidas no aqui e agora são um imperativo ético, que se impõe de forma incontornável no longo processo de construção de sociedades justas, democráticas e sustentáveis. Trata-se de uma responsabilidade coletiva, pois não é imaginável um Brasil democrático convivendo com a chaga da miséria e da fome. A proposta do governo tem possibilidades, sim, de criar condições mínimas de inclusão social dos milhões de brasileiros e brasileiras, sobretudo crianças e adolescentes. Mas sem a ativa cooperação de vários níveis de governo, de políticos e partidos, de empresas e, sobretudo, de nós mesmos, a múltipla e diversa cidadania, a tarefa fica mais difícil. Nesse sentido, o anúncio do programa de erradicação da miséria, mostrando a determinação do governo, é, também, um chamado para a responsabilidade coletiva no presente.
Discute-se o tamanho do problema da miséria, a tal linha, como se o problema fosse a medida e não a existência da miséria em si e a nossa envergonhada convivência com ela. Por que tantos se incomodam com o fato de elevar a linha de renda para medir a população que vive na miséria? O que é passar de aproximadamente R$ 50,00 (medida do Banco Mundial) para R$ 70,00 per capita mês? Você, que está me lendo, quantos dias do mês poderia passar com míseros setenta reais? Poucos se indignam com o fato de que basta tão pouco para ser considerado miserável no Brasil, sexta economia mundial pelo PIB! Mas muitos se manifestaram contra essa pequena elevação.
E se pensássemos pelo inverso, com quanto tamanho de riqueza podemos suportar na nossa volta sem nos envergonhar? Temos um punhado de bilionários, medidos em bilhões de dólares. Estes poucos abocanham mais do que os 8,5% de população considerada miserável. Aliás, já está na hora no Brasil, também, de fazer um programa de erradicação da extrema riqueza, aquela que tem como contrapartida a extrema pobreza. Milagres não existem, ou compartimos a riqueza coletiva do país ou vamos continuar a ser uma das sociedades mais desiguais e injustas do planeta. Penso que Dilma mostrou determinação ao elevar minimamente o patamar de nossa ambição e o dever de erradicar a extrema pobreza. Ela se deu e nos propôs uma tarefa maior, mais desafiadora, só isto! Que são os poucos bilhões de reais de recursos públicos – um bem comum, importante frisar –, algo em torno de R$ 20 bilhões ano, do programa de erradicação da miséria diante das centenas de bilhões transferidos para os agarrados nas tetas do Estado, os titulares dívida pública?
Assumindo o imperativo ético e a responsabilidade coletiva de enfrentar a miséria já – maior ou menor, mas parte constitutiva da nossa sociedade – não podemos deixar de nos indagar sobre as mudanças necessárias para quebrar a lógica criadora do problema. O Brasil, neste aspecto, vive uma encruzilhada ímpar. Podemos simplesmente reproduzir o padrão de sociedades desenvolvidas, voltadas prioritariamente à acumulação capitalista de riquezas a todo custo como forma de organizar nossa economia, sociedade e poder. Aliás, parece que estamos caminhando rapidamente nesta direção, que nos leva a priorizar a conquista de posições no mercado externo, ao extrativismo sem limites, inclusive ao petróleo do pré-sal visto como salvação, ao agronegócio predador de florestas, aos mega projetos e à energia nuclear, só para lembrar opções na contramão da história. Estamos ainda longe de ter no centro do debate público democrático e de nossas opções estratégicas o priorizar, acima de tudo, padrões de produção de felicidade para todos, de ser e estar bem ao invés de ter sempre mais, como medida de riqueza. Ainda não vemos a íntima relação entre o modelo de desenvolvimento dominante e o próprio problema da miséria, algo intrínseco a ele. Pior, ainda é embrionário entre nós o debate sobre a relação entre justiça social e justiça ambiental. Muitos, no próprio governo ou na sua base parlamentar – como deu para ver na questão do Código Florestal – optam pela destruição ambiental em nome da justiça social.
Mas o Brasil tem à sua frente o desafio de fazer outras opções. Isto não dá para esperar do governo e de nossos políticos. Pior ainda seria esperar de empresas. Cabe a cidadania decidir. Podemos e devemos enfrentar os problemas emergenciais, sem desculpas. Afinal, temos recursos de sobra para tanto. Aí esta o mérito do governo Dilma ter definido isto como pedra angular. Mas, definitivamente, isto não basta. Precisamos reavaliar nossas opções estratégicas de desenvolvimento para que, amanhã, não estejamos lamentando e nos curvando diante da inevitabilidade da miséria. Miséria é algo socialmente criado, está no modo como nos organizamos e produzimos. Para outro Brasil, sem miséria, justo, democrático e sustentável, a hora das opções chegou. Não deixemos isto para os nossos netos, pois a tarefa deles de rever nossas opções será ainda mais difícil.
Comentário 1
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Eduardo
21 de setembro de 2012Pra mim o grande etvnare continua sendo a limitae7e3o do acesso e0 informae7e3o. Tudo ainda e9 tratado como sigiloso, ou a postura sucumbe ao velho chave3o de que ter informae7e3o e9 ter poder, e por isso poucos na administrae7e3o pfablica este3o dispostos a realmente dar luz a essas informae7f5es. E, mesmo em ambientes interessados em transpareancia, as informae7f5es ne3o se3o lapidadas, mas sim fornecidas em estado bruto, dificultando o acesso. Algo como a informae7e3o este1 le1, e9 sf3 procurar , sendo que a informae7e3o e9 uma concha e o le1 e9 a praia de Copacabana. Temos muito o que caminhar.