Rio de Janeiro, 17 de março de 2015
Por Ibase
A violência em favelas ocupadas por Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) no Rio de Janeiro foi tema da primeira edição do Conversatório Ibase de 2015, no último dia 10. Para debater o assunto com o público foram convidados Alan Brum, do Instituto Raízes em Movimento, no Complexo do Alemão; Renata Trajano, também do Complexo do Alemão; Fransérgio Goulart, do Fórum Social de Manguinhos e Fórum de Juventude de Manguinhos; e Cleonice Dias, pesquisadora da Fiocruz e membro de vários movimentos sociais da Cidade de Deus e vice-presidente do Conselho Curador do Ibase.
Ao fazer a abertura do evento, o diretor do Ibase Itamar Silva ressaltou a frequência assustadora com que moradores de favela têm sido mortos em autos de resistência e balas perdidas. Ao final, lançou a pergunta: “qual o futuro desta política?”.A resposta não é fácil, mas durante o Conversatório a troca de ideias ofereceu subsídios ao público para uma reflexão crítica sobre a política de ocupação nas favelas da cidade.
– É uma avaliação errada a de que as UPPs vão resolver o problema de segurança na cidade. Onde moro, a situação piorou. A rotina de tiro é diária, tem hora marcada,e as ameaças vem de todos os lados – contou Renata Trajano, que, como muitos presentes no evento,estavam estarrecidos com a notícia publicada um dia antes na imprensa, de que policiais de UPPs acompanhariam a vida escolar de jovens moradores de favelas ocupadas.- Policial não tem que entrar na escola.Esta medida só mostra que a situação vai ficar cada vez pior para quem mora em favelas! – completou Renata.
O número de mortos no Alemão nos últimos meses dá a dimensão da situação crítica vivida por moradores do local: de janeiro até hoje foram contabilizados 27 mortos, seis em apenas dois dias. Ao longo de 2014, foram 40. A informação foi divulgada por Alam Brum,do Instituto Raízes em Movimentos, que tem se dedicado a levantar esses dados porque vê problemas nos dados que normalmente são divulgados sobre as favelas.
– Os dados oficiais são frágeis. Eles são coletados a partir de um olhar da política de segurança pública para a favela. A última pesquisa sobre o tema, da Uerj, deixou de fora, por exemplo, dados de desaparecidos em UPPs. Precisamos de dados produzidos dentro da favela para confrontar com a estatística oficial e ter mais subsídios para realizar um controle social das políticas para a favela. Este conhecimento é estratégico e pode resultar em um diálogo importante entre academia e favela – defendeu Alam.
Cleonice Dias, da Cidade de Deus, trouxe mais um ingrediente que ajuda a pensar de que modo o governo do estado tem agido em relação às favelas. Para ela, o Estado tem atuado nas favelas ocupadas a partir de projetos focais, promovendo a desmobilização da comunidade:
– Como tem muita gente sem dinheiro para os seus projetos originais, acabam aceitando esses projetos, que não tem política, não tem lé-com-crê (não tem identidade com as reais demandas da comunidade). Só sobra um Estado que não fala nada e a política de segurança, que faz calar – observou.
Para Fransergio Goulart, de Manguinhos, a favela, na visão do Estado, é um território ainda por fazer. Os favelados, para ele, não são vistos como protagonistas das possibilidades de transformação pela sociedade.
– Ao contrário do que se pensa, muita estratégia de resistência tem acontecido nas favelas cariocas,protagonizadas especialmente pela juventude. São eles que têm tido a capacidade, nesses territórios, para resistir usando a criatividade, a cultura.
Foto: Ibase
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