Do site do Inesc
Representantes de diversos movimentos sociais que fazem parte do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios frente à Mineração, entre eles o Ibase, participaram nesta semana de mais uma audiência pública na Comissão Especial da Mineração, na Câmara dos Deputados. As organizações alegam que o projeto o novo marco da mineração, que tem votação marcada para a semana que vem, deverá passar por mudanças, principalmente nas lacunas relacionadas aos danos sociais e ambientas que a exploração do minério pode causar. Uma das lutas das organizações é a pressão para que o projeto receba emendas relacionadas aos temas que não estão contemplados na nova lei.
Para saber mais sobre o assunto, confira abaixo a entrevista feira por Rogério Daflon, do Observatório do Pré-Sal, que acompanha o debate em torno da indústria extrativista, com o pesquisador do Ibase Carlos Bittencourt.
Rogério Daflon
Do Observatório do Pré-sal:
Na primeira audiência pública da Comissão Especial da Câmara dos Deputados, que discute o projeto de lei do Novo Código da Mineração, uma mesa formada por movimentos sociais, empresários e governo federal, além de parlamentares, chegou a consenso: o regime de urgência para a votação do projeto é algo sem qualquer propósito. Não há como aprovar um novo código sobre o qual o governo federal só tinha discutido com as grandes empresas do setor mineral, em detrimento, por exemplo, da sociedade civil e das pequenas empresas do segmento. Carlos Bittencourt, pesquisador do Ibase, falou em nome do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios frente à Mineração., numa mesa em que os empresários eram maioria na Federação das Indústria do Estado do Rio Janeiro. Nesta entrevista, ele explica os problemas do projeto de lei e afirma que, em alguns pontos, ele é mais retrógrado do que o atual Código da Mineração, formulado em 1967, em plena ditadura militar.
Observatório do Pré-sal: Qual é o tamanho do setor mineral hoje?
Carlos Bittencourt: Desde 2009, sem o saldo positivo da balança comercial da mineração, a balança comercial brasileira seria deficitária. Porque o saldo da balança comercial mineral tem sido maior do que o saldo comercial da balança comercial brasileira total. Como a mineração é uma atividade material, movimenta uma grande massa de recursos naturais para existir. O crescimento da mineração significa um crescimento também sobre o territórios e consequentemente sobre as comunidades e o meio ambiente.
Observatório do Pré-sal: Quais são esses impactos?
Carlos Bittencourt: Um dos mais notáveis é o impacto sobre a água. A mineração consome quantidades gigantescas de água. Em 2012, foram mais de cinco quatrilhões de litros de água, o equivalente ao consumo de oito cidades do Rio de Janeiro. Além disso, a mineração é uma das atividades econômicas que mais poluem as águas superficiais e subterrâneas no Brasil. Outros dois impactos importantes dizem respeito aos trabalhadores do setor, já que a mineração é dos segmentos que mais mata, mutila e enlouquece no país. E a mineração vem removendo famílias e afetando os modos de vida de diversas comunidades atingidas por sua logística.
Observatório do Pré-sal: Como o projeto de lei trata dessas questões?
Carlos Bittencourt: Por incrível que pareça, a proposta apresentada pelo governo federal ao Legislativo representa um retrocesso quanto a esses pontos na comparação com o atual código apresentando em 1967, em plena ditadura militar. Se neste código de um tempo de exceção, em seu artigo 54, se condicionava a atividade mineradora à responsabilidade sobre os usos da água e ao impacto de vizinhança e ao dano e prejuízo causados a terceiros, no atual projeto de lei não há sequer menção a esses temas. Nesse aspecto, o governo Castello Branco se mostrava mais progressista do que o atual governo federal.
Observatório do Pré-sal: A proposta do novo código então é essencialmente voltada para o negócio da mineração?
Carlos Bittencourt: Sim. A omissão quanto a esses pontos revela uma visão que trata a mineração exclusivamente como uma atividade econômica, como se ela ocorresse num espaço vazio, sem pessoas, comunidades, natureza.
Observatório do Pré-sal: Isso tem a ver com o lobby do segmento?
Carlos Bittencourt: Certamente. Em estudo realizado pelo Ibase (“Quem é quem nas discussões do novo código da mineração). fica claro que as empresas investem alto na sua relação com as instituições políticas brasileiras. Só as principais empresas do setor, como a Vale, CSN e Anglo-América, somadas, doaram mais de R$ 17 milhões nas eleições de 2010. Não à toa, um dos principais beneficiados por essas doações são nada mais que o presidente (deputado federal Gabriel Guimarães-PT/MG) e o relator Leonardo Quintão (deputado PMDB-MG) da Comissão Especial, que tiverem campanhas de R$ 3 milhões e R$ 2 milhões, receberam cerca de 20% das empresas mineradoras.