Sandra Jouan
da equipe do Ibase
Entidades como o Ibase são importantes como referências no processo democrático. É necessário que existam canais que possam ser elos de interface da sociedade civil, tanto do ponto de vista da informação, quanto como elemento propositivo e de interferência na dinâmica que radicaliza os caminhos de construção da democracia.
Em nossa sociedade, a pluralidade de interesses requer uma contínua vigilância na condução dos caminhos que constroem a sociedade atual e futura. Muitos interesses são antagônicos, buscar consensos e dissensos que contribuam para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária é tarefa que requer uma contínua costura. Articular, dialogar, denunciar e propor são ações próprias de entidades como o IBASE. O IBASE é uma voz plural, uma escuta atenta, ressoa e interfere em questões que atualmente estão no cerne das discussões sociais e ambientais da contemporaneidade.
A sobrevivência de entidades como o IBASE é uma pauta atual, para sua existência busca-se formas alternativas de financiamento e a autonomia vira uma tônica. Mesmo sendo difícil manter a autonomia, ideias e perspectivas não podem ser apagadas, a interferência no processo se faz nas brechas e na condução dos projetos, esta questão está dada e caminhos têm que ser pensados e repensados. A sobrevivência das instituições está em jogo, as bandeiras e lutas têm que se inserir neste contexto e buscar formas de interferir no processo.
A derrota dos modelos de socialismo, o neoliberalismo, a ascensão dos países emergentes, a crise europeia, a política da BRICS, a crise ambiental e tantas outras questões são assuntos que merecem ser debatidos, que rumos e alianças devemos fortalecer para proteger a vida no planeta. Como mudar o paradigma do capital para preceitos mais coadunados com a construção de um mundo com mais qualidade de vida, esses são dilemas que o IBASE é referência no diálogo local, nacional e mundial.
E o que justifica a existência do seu trabalho no IBASE?
Acredito que me insiro na luta que Betinho durante toda sua existência defendeu ao trilhar os caminhos da democracia. Venho ao longo de várias décadas discutido as questões urbanas, mais especificamente as relacionadas as favelas. O tema da cidade faz parte de minha trajetória, sempre no meu trilhar profissional tive como perspectiva contribuir para garantia dos direitos da cidadania urbana, principalmente de populações pobres. Não é possível dissociar minha trajetória de vida, de minhas escolhas. Me inseri em muitas lutas. Bandeiras foram defendidas, certezas e incertezas trilharam comigo a vontade de contribuir para uma sociedade mais justa e fraterna. Como diz Ivan Lins:
“No novo tempo, apesar dos castigos
Estamos em cena, estamos nas ruas, quebrando as algemas
Pra nos socorrer, pra nos socorrer, pra nos socorrer
No novo tempo, apesar dos perigos
A gente se encontra cantando na praça, fazendo pirraça
Pra sobreviver, pra sobreviver, pra sobreviver
Pra que nossa esperança seja mais que a vingança
Seja sempre um caminho que se deixa de herança”
O IBASE é o espaço que atualmente permite que eu sonhe e realize ações concretas que justifica a existência não só do meu trabalho, mas, sobretudo, da perspectiva de interferir na construção de uma cidade para todos e todas. O IBASE tem como premissa e responsabilidade social e política afirmar os valores da inclusão e justiça social, da democracia participativa, da igualdade na diversidade social e cultural e da sustentabilidade socioambiental, as ações desencadeadas estão sempre em consonância com o que acredito e tenho como compromisso.
Atualmente, as contradições advindas do modelo neoliberal de desenvolvimento impõem ao cenário político institucional do Brasil caminhos extremamente questionáveis. Os interesses do capital pressionam e ganham espaço. Mesmo diante do que se apresenta no cenário internacional – crise europeia, americana, novos movimentos sociais- o Brasil se depara com uma política de desenvolvimento, apesar do avanço no campo das políticas socioeconômicas inclusivas, privilegia o capital privado, vide política da mineração, dos portos, das cidades. O Brasil moderno e competitivo é o que importa, mesmo diante das contradições que se impõem com relação a este modelo de desenvolvimento.
No Rio de janeiro, palco dos megaeventos, os interesses privados são privilegiados, em nome de uma cidade de negócios, competitiva e moderna. Os movimentos sociais fragmentados interferem, mas poucos conseguem mudar, o processo atropela e impõe. Mas do que nunca do IBASE tem que somar junto com outras instituições esforços no sentido de criar canais que possam ecoar as vozes dissonantes deste processo. A mídia oficial não dá espaço, canais como IBASE encontram espaço para serem articuladores desta teia.
Como o IBASE vive a diversidade interna e externamente?
O IBASE atualmente enfrenta novos desafios que acabam incidindo sobre como se vive a diversidade interna e externa.
A diversidade interna pode ser analisada sob diversos aspectos: diversidade de projetos, diversidade do quadro de pessoal (composição de gênero, raça e faixa etária, forma contratual) e diversidade de opiniões.
A reformulação em que o IBASE vem passando nos últimos anos não só propiciou o fim dos laços profissionais de pessoas que contribuíram para a construção histórica do IBASE e que possibilitou um compartilhamento de ideais e trabalhos conjuntos, como também, inseriu uma nova forma de contratação que torna efêmera as relações de trabalho. Além da sazonalidade das ações, os novos quadros não tiveram a mesma referência teórica e vivência política do quadro antigo de pessoal, a maioria das contratações atuais do IBASE é construída a partir de projetos e ações, mesmo que com perspectivas democráticas e ideais comuns, não tiveram tempo de solidificar uma relação comum de construção.
Aliada a estas questões o IBASE, ainda não alicerçou internamente mecanismos que permitam uma teia com pontos de interseção entre os projetos desenvolvidos, numa perspectiva de compartilhamento de compromissos do IBASE. Os projetos pelas suas dinâmicas são desenvolvidos de forma isolada, sem, entretanto, se entrelaçarem, buscando nas suas diversidades, as identidades que os aproximam das metas do IBASE. Os projetos são referenciados por si só sem a costura com a instituição.
Acredito que este processo não é único do IBASE é como a sociedade se desenvolve, mesmo com a expansão da comunicação e da informação. Apesar do mundo conectado, os valores valorizados não são coletivos, buscar sinergias na diversidade de interesses individuais é um desafio. Os valores humanos, apesar dos avanços de uma visão mais crítica, estão cada vez mais voltados para o indivíduo para as lutas isoladas e buscar o encontro, os pontos convergentes são tentativas ainda em construção ou em transformação.
Outra questão que se impõe é referente a falta de debate interno que promova o diálogo e o compartilhamento de visões que mesmo diversas precisam estar coadunadas com as perspectivas institucionais. Os debates não são promovidos pela instituição, impedindo o compartilhamento de visões, maior entrelaçamento das equipes e sentimento de pertencimento e comprometimento com a instituição.
Com relação à diversidade externa alguns pontos devem ser enfocados. Os caminhos para a construção de um mundo melhor são diversos, a internet propiciou termos a dimensão das experiências vivenciadas pelo planeta. A pluralidade das cores e cheiros nos deixa confusos. O capital encontra novas formas de exploração, mesmo que com discursos progressistas, cada povo, cada grupo, cada pessoa vai neste emaranhado tentando encontrar saídas e formas coletivas de lutas.
O IBASE abraça a pluralidade, a diversidade numa perspectiva de mudanças de consolidação de uma sociedade plural, entretanto, este plural é diverso e contraditório, buscar convergência para ir se avançando em conquistas que permitam a edificação de uma sociedade mais justa, tanto social quanto ambientalmente, encontram no caminho pontos que são conflitantes. Não existe caminho único, como pregava modelos anteriormente pensados, a crise ambiental afeta a todos, independente de classes, mesmo que de forma desigual, entretanto, as visões e interesses com relação aos caminhos a serem tomados são múltiplos e muitas vezes contraditórios. A visão coletiva da problemática ambiental é compactuada por todos, entretanto, os interesses e caminhos tomados encontram grande abismos.
Entender o mundo de forma fragmentada é um erro; o que hoje passamos faz parte do melo socioeconômico imperante no mundo, nada está dissociado, inclusive, a pluralidade. Anteriormente julgamos que os interesses estavam antagônicos, somente em duas vertentes: os que detêm o capital e os que são explorados. Hoje esta realidade é retaliada, não porque não existam interesses antagônicos, mas as nuances de interesses são múltiplos, não podem ser aglutinados de forma tão mecânica. As etapas históricas requerem uma manobra de articulações, onde estão envolvidos diversos interesses que, para avançar, tem que se identificar pontos convergentes. O mundo é diverso, socialmente, culturalmente, economicamente e politicamente. A dinâmica da transformação é saber se associam as propostas coletivas que dizem respeito aos interesses das classes sociais menos favorecidas, aos interesses que levem em conta um mundo ambientalmente sustentável. Como buscar as sinergias que possibilitarão a construção da sociedade sustentável futura.
Comentário 1
Não são permitidos comentários.
tatiana
28 de maio de 2013Será possível receber informações maiores sobre o trabalho do Ibase, manifestações, debates, etc. Gostaria de me fazer presente dentro das minhas possibilidades.