Rio de Janeiro, 29 de abril de 2015
Por Ibase
Já estamos em plena estação seca e embora tenha chovido um pouco mais em abril, o fantasma do desabastecimento de água ainda paira no ar, especialmente na região Sudeste que é abastecida por bacias hidrográficas que. Quem afirma é o economista Guilherme Delgado, doutor em Economia pela Unicamp e consultor da Comissão Brasileira de Justiça e Paz, que vem prestando uma consultoria também para o Ibase. Em uma das vindas ao Rio, conversamos rapidamente sobre o tema da crise hídrica e ele trouxe à tona um aspecto importante: o manejo do sistema hídrico.
– O sistema hídrico incide em todo o território nacional e embora seja um bem comum, o manejo é estritamente privado. E é assim porque o proprietário da terra se sente dono dos recursos, quase um ‘senhorzinho da natureza’ – afirmou.
Ele explica que a Constituição Brasileira, em seu artigo 186, trata do uso da terra e sua função social, mas é vaga quando se refere ao uso dos recursos naturais. Por outro lado, as leis mais específicas que tratam do tema ambiental são fragmentadas e não estabelecem uma ligação direta entre o uso de recursos da natureza e a função social da terra.
Para Delgado, se houvesse esta vinculação, haveria a possibilidade de quem não cumprisse a legislação ambiental, ou seja, não respeitasse a natureza usando de forma racional seus recursos, sofrer desapropriação. Mas não é assim hoje. O Estatuto da Terra, segundo o economista, é vago quando trata do tema e as leis ambientais são pulverizadas. A única sanção que o proprietário que desrespeita alguma lei ambiental sofre é a multa.
Soma-se a este quadro, o entendimento no senso comum de que a água é um bem ilimitado. Sendo assim, a maioria dos proprietários de terra no país, na visão de Delgado, se sentem à vontade para usar os recursos hídricos como bem entendem sem se preocupar com qualquer tipo de sanção.
– A gestão das Bacias Hidrográficas, que abastecem vários reservatórios do país, também é falha no sentindo de preservar o recurso. Não temos, no país, uma cultura preservacionista do recurso hídrico. E isso é grave – completa.
Grave também, para ele, é uma espécie de acomodação da sociedade civil, que ainda parece não ter entendido que o custo social da má gestão dos recursos hídricos é alto.
– A sociedade reage ao imediato e o cenário de falta d´água parece ainda ser distante, mesmo depois do que ocorreu em São Paulo. É preciso muito mais ações do que as que estão em curso de caráter puramente estrutural para desviar água para abastecer os reservatórios. As leis que regulam o tema são ineficazes e o processo educativo para o uso preservacionista do recurso é urgente. Do contrário, ao que parece, a possibilidade de vivermos o desabastecimento, especialmente nos centros urbanos, vai persistir.
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