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Mariana, Brumadinho e Canaã dos Carajás: riquezas e tragédias do Brasil

Casa destruída pela lama tóxica em Brumadinho (Foto: Ricardo Stuckert / Creative Commons)

Athayde Motta
Diretor do Ibase

O crime ambiental e trabalhista ocorrido em Brumadinho não é o único caso da indústria extrativa a merecer atenção na atual conjuntura, especialmente em um governo que já anunciou que pretende ampliar a exploração de áreas protegidas ambientalmente.  Uma pesquisa realizada pelo Ibase e pela Faculdade de Economia da Universidade Federal do Para (UFPA), em 2018, mostrou como a implantação de duas grandes minas transformou a dinâmica populacional, social e econômica da cidade de Canaã dos Carajás, no estado do Pará.
As minas em questão são a Sossego, que explora o cobre desde 2004; e S11D, que entrou em operação em 2016 e é uma das maiores minas de ferro a céu aberto do mundo. Ambas são de titularidade da Vale S/A.
O estudo do Ibase e da UFPA revela como estão sendo utilizados os recursos da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem) – a renda gerada pela exploração de minérios e repassada, em grande parte, aos municípios produtores. Canaã dos Carajás chama atenção não apenas pelo fato de abrigar duas grandes minas, mas pela projeção crescente de extração mineral com o consequente aumento exponencial da Cfem. Em 2005, o município arrecadou R$ 11,3 milhões dos chamados royalties da mineração, passando para R$ 40,3 milhões, em 2017, o que o transformou no terceiro maior arrecadador do Pará e o sexto do Brasil, neste último ano. Para 2020 a projeção é de R$ 350 milhões – gerando um salto de Cfem per capita de R$ 767,00 para R$ 7.000, em apenas quinze anos. Apesar do crescimento econômico, o município ainda convive com problemas ligados à superação da pobreza; da desigualdade de renda, racial e de gênero; da violência e busca pela sustentabilidade urbana. A pesquisa evidencia que, para obter avanços nesses indicadores, é necessário bem mais do que o aumento de renda.
O estudo aponta também que a prioridade de uso da Cfem ainda não tem sido a de criar alternativas produtivas que minimizem a dependência do município em relação à mineração e que compensem o esgotamento de seu capital natural. São evidências que apontam para uma perda de oportunidades que os volumosos recursos da Cfem proporcionam, na busca por maior prosperidade tanto para a atual quanto para as futuras gerações, além de indicarem o descolamento entre as necessidades de desenvolvimento local e a sua real destinação.
Em Canaã dos Carajás, está a base do maior investimento mineral do Brasil nos últimos anos. Localizado na região sudeste da Amazônia brasileira, a cidade tem sua origem associada aos projetos de reforma agrária, mas é internacionalmente conhecida tanto pela quantidade como pela qualidade de suas reservas minerais de cobre. Tal dado evidencia a dicotomia de regiões que, apesar de ricas em recursos naturais, concentram altos índices de pobreza e desigualdade.
É preciso destacar que em muitas cidades brasileiras a mineração é um dos setores fundamentais da matriz econômica local.  Além disso, há toda uma complexidade de aspectos que variam de acordo com cada região onde a atividade é desenvolvida – tanto pela natureza geológica das jazidas como também pelas notáveis influências que diferentes contextos socioeconômicos regionais exercem sobre condições estruturais e institucionais da mineração. Ressalte-se também que, independentemente do local onde esteja presente, a mineração é uma atividade produtiva de natureza temporária e com enormes impactos ambientais e sociais. Em Canaã dos Carajás não é diferente.  O que esperamos é que o país esteja atento para que não se repitam os crimes de Mariana e Brumadinho.

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